O Mito, Uma necessidade do Homem?
Trabalho Realizado por: Vítor Fragoso - ISMAI - Instituto Superior da Maia
2º ano Psicologia - Trabalho realizado no âmbito da disciplina de Antropologia Socio-Cultural
Introdução
O mito apesar
de ser um conceito não definido de modo preciso e unânime, constitui uma
realidade antropológica fundamental, pois ele não só representa uma explicação
sobre as origens do homem e do mundo em que vive, como traduz por símbolos
ricos de significado o modo como um povo ou civilização entende e interpreta a
existência.
Mito é uma narrativa tradicional de conteúdo religioso, que procura
explicar os principais acontecimentos da vida por meio do sobrenatural. O
conjunto de narrativas desse tipo e o estudo das concepções mitológicas
encaradas como um dos elementos integrantes da vida social são denominados
mitologia.
A elaboração
deste trabalho pretende no fundo tentar perceber até que ponto o mito é
importante ou não para o desenvolvimento social, cultural e psicológico do
Homem.
O Mito uma necessidade do Homem? É a questão que procurarei esclarecer
no decorrer deste trabalho.
Definição
de Mito
Segundo
Mircea Eliade, a tentativa de definir mito é a seguinte, “o mito é uma
realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada
em perspectivas múltiplas e complementares....o mito conta uma história
sagrada, relata um acontecimento que teve lugar no tempo primordial, o tempo
fabuloso dos começos...o mito conta graças aos feitos dos seres
sobrenaturais, uma realidade que passou a existir, quer seja uma realidade
tetal, o Cosmos, quer apenas um fragmento, uma ilha, uma espécie vegetal, um
comportamento humano, é sempre portanto uma narração de uma criação,
descreve-se como uma coisa foi produzida, como começou a existir...”
Mircea
Eliade, Aspectos do Mito, pág12/13
O mito só
fala daquilo que realmente aconteceu do que se manifestou, sendo as suas
personagens principais seres sobrenaturais, conhecidos devido aquilo que fizeram
no tempo dos primordios. Os mitos revelam a sua actividade criadora e mostram a
“sobrenaturalidade” ou a sacralidade das suas obras. Em suma os mitos
revelam e descrevem as diversas e frequentemente dramáticas eclosões do
sagrado ou sobrenatural nomundo. É está “intormição” ou eclosão do Ainda segundo
Mircea Eliade, “o mito é considerado como uma história sagrada, e portanto
uma história verdadeira, porque se refere sempre a realidades. O mito cosmogónico
é verdadeiro porque a existência do mundo está aí para o provar, o mito da
origem da morte é também verdadeiro porque a mortalidade do homem
prova-o...e pelo facto de o mito relatar as gestas dos seres sobrenaturais e
manifestações dos seus poderes sagrados, ele torna-se o modelo exemplar de todas as actividades humanas significativas”.
Mircea
Eliade, Aspectos do Mito, pág.13
Muitas histórias mitológicas conservam-se na mente das pessoas, dando uma
certa, perspectiva daquilo que acontecia em suas vidas. “Essas informações
provenientes de tempos antigos têm a ver com os temas que sempre deram sustentação
à vida humana, construíram, civilizações e formaram religiões através dos
séculos, e têm a ver com os profundos problemas interiores, com os profundos
mistérios, com os profundos limiares da nossa travessia pela vida...”
Joseph
Campbell, www.geocities.com/viena/2809/mitos.html
Aquilo
que os seres humanos têm em comum revela-se no mito. Segundo Campbell, eles são
histórias da nossa vida, da nossa busca da verdade, da busca do sentido de estarmos
vivos. Os mitos são pistas para as potencialidades espirituais da vida humana,
daquilo que somos capazes de conhecer e experimentar interiormente. O mito é o
relato a experiência da vida. Eles ensinam que nós podemos voltar-nos para
dentro. Assim
sendo os mitos têm como tema principal e fundamental que é a busca da
espiritualidade interior de cada um de nós. “Os
mitos estão perto do inconsciente colectivo e por isso são infinitos na sua
revelação”. Joseph
Campbell, www.geocities.com/viena/2809/mitos.html A narração mitológica envolve basicamente acontecimentos
supostos, relativos a épocas primordiais, ocorridos antes do surgimento dos
homens (história dos deuses) ou com os "primeiros" homens (história
ancestral). O verdadeiro objecto do mito, contudo, não são os deuses nem os
ancestrais, mas a apresentação de um conjunto de ocorrências fabulosas com
que se procura dar sentido ao mundo. O mito aparece e funciona como mediação
simbólica entre o sagrado e o profano, condição necessária à ordem do mundo
e às relações entre os seres. Sob sua forma principal, o mito é cosmogônico
ou escatológico, tendo o homem como ponto de intersecção entre o estado
primordial da realidade e sua transformação última, dentro do ciclo
permanente nascimento-morte, origem e fim do mundo. As
semelhanças com a religião mostram que o mito se refere -- ao menos em seus níveis
mais profundos -- a temas e interesses que transcendem a experiência imediata,
o senso comum e a razão: Deus, a origem, o bem e o mal, o comportamento ético
e a escatologia (destino último do mundo e da humanidade). Crê-se no mito, sem
necessidade ou possibilidade de demonstração. Rejeitado ou questionado, o mito
se converte em fábula ou ficção. Tipos
de Mito Mitos
cosmogônicos Dentre as
grandes interrogações que o homem permanece incapaz de responder, apesar de
todo o conhecimento experimental e analítico, figura, em todas as mitologias, a
da origem da humanidade e do mundo que habita. É como resposta a essa interrogação
que surgem os mitos cosmogônicos. As explicações oferecidas por esses mitos
podem ser reduzidas a alguns poucos modelos, elaborados por diferentes povos. No hinduísmo,
o Rigveda descreve graficamente o nada a original , no qual respirou o Um,
nascido do poder do calor. A água é o
elemento primordial mais frequente das cosmogonias, sobretudo nas mitologias asiáticas
e da América do Norte. A consolidação da terra faz-se pela acção de um
intermédio (espirito ou animal) que a retira do fundo da água e introduz no
mundo um elemento de desordem ou mal. A criação a
partir do nada, aparece unicamente
pela palavra de deus facto que aparece claramente no livro do Génesis.
Ao lado da
preocupação com o enigma da origem, figura para o homem, como grande mistério,
a morte individual, associada ao temor da extinção de todo o povo e mesmo do
desaparecimento do universo inteiro. Já Platão anunciava
a reencarnação e a imortalidade da alma na sua obra “Fédom”, acreditando,
que as almas dos seres virtuosos iam para junto dos Deuses bons, e no momento da
morte a alma separava-se do corpo, permanecendo imperecível. O corpo
simbolizava o cárcere da alma, e só a morte a poderia liberta-la desse cárcere,
daí a serenidade de Sócrates no momento da sua morte. .
Destruição escatológica - Os mitos retractam frequentemente o fim do
mundo como uma grande destruição, de natureza bélica ou cósmica. Antes da
destruição, surge um messias ("ungido") ou salvador, que resgata os
eleitos por Deus. Esse salvador pode ser o próprio ancestral do povo ou
fundador da sociedade, que empreende uma batalha final contra as forças do mal
e, após a vitória, inaugura um novo estágio da criação, um novo céu e uma
nova terra. Mitos
sobre o tempo e a eternidade
Os corpos celestes sempre atraíram a curiosidade e o interesse humano,
em todas as culturas. A regularidade e precisão inalteráveis do movimento dos
astros foram com certeza uma imagem poderosa na formação de uma ideia de
"tempo transcendente", concebido como eternidade, em contraste com o
mundo de incessantes alterações e os acontecimentos inesperados vividos no
tempo terreno. O retorno cíclico dos fenómenos siderais e de processos
naturais terrestres projectou-se, em algumas culturas, na concepção cíclica
do tempo. Mitos
de transformação e de transição
Numerosos mitos narram mudanças cósmicas, produzidas ao término de um
tempo primordial anterior à existência humana e graças às quais teriam
surgido condições favoráveis à formação de um mundo habitável. Outras
grandes transformações e inovações, como a descoberta do fogo e da
agricultura, estão associadas aos mitos dos grandes fundadores culturais. Nos
mitos, são frequentes as transformações temporárias ou definitivas dos
personagens, seja em outras figuras humanas ou em animais, plantas, astros,
rochas e outros elementos da natureza. “Na
maior parte das culturas que atingiram a complexidade de civilização, as
qualidades tidas em mais alta estima são as envolvidas nos processos mentais
de um caracter particular a que, à falta de melhor palavra chamaremos
“espiritual”. As competências espirituais incluem a habilidade de controlar
directamente a experiência, manipulando os menes( herança cultural,
transmitida ao longo dos séculos), que aumentam a harmonia entre os
pensamentos, emoções e vontades da pessoa. Aqueles que exercem estas competências
são chamados Xamãs, sacerdotes, filósofos, artistas e homens, ou mulheres, sábios
dos mais variados tipos. São respeitados e recordados, e mesmo que não lhes
sejam concedidos poder ou dinheiro, os seus conselhos são ouvidos, e a sua própria
existência é acarinhada pelas comunidades em que vivem. À primeira
vista, é difícil compreender por que razão as contribuições espirituais são
consideradas tão importantes pela maioria das sociedades. De um ponto de vista
evolutivo, poderia parecer que não têm qualquer valor
prático em termos de sobrevivência. Os esforços dos agricultores,
construtores, comerciantes, cientistas, etc...produzem benefícios óbvios e
concretos; e a actividade intelectual o que produz? O que é comum
a todas as formas de espiritualidade é a tentativa de reduzir a entropia na consciência. A actividade espiritual visa
produzir harmonia entre desejos contraditórios, esforça-se por encontrar
significado nos acontecimentos casuais da vida e tenta reconciliar os objectivos
humanos com as forças que se lhes opõem a partir do meio. Aumenta a
complexidade ao clarificar as componentes da experiência individual, tais como
o bom e mau, amor e ódio, Estes esforços
para levar harmonia à mente baseiam-se frequentemente, mas não sempre, numa
crença em poderes sobrenaturais. Muitas “religiões”orientais, e filosofias
estóicas da antiguidade, tentaram desenvolver uma consciência complexa sem o
recurso a um ser supremo. Algumas tradições espirituais, com o ioga hindu ou o
taoismo, concentram-se exclusivamente em conseguir harmonia e o controlo da
mente sem qualquer interesse a entropia social, outras, como a tradição
confuciana, visavam primariamente estabelecer
a ordem social. Em todo caso, se a importância
atribuída a estas tentativas pode servir de indicador, a redução do conflito
e da desordem através de meios espirituais parece ser muito adaptativa. Sem
elas é provável que as pessoas ficassem cada vez mais desencorajadas e
confusas, e que a guerra hobbesiana de “todos contra todos” se tornasse uama
característica mais proemimente da paisagem social do que já é”. Mihaly
Csikszentmihalyi, Novas Atitudes Mentais, pág.227/228 Mito
e religião
Alguns especialistas, como Mircea Eliade, estudioso de história
comparada das religiões, atribuem importância especial ao contexto religioso
do mito. Com efeito, são muito frequentes os mitos que versam sobre a origem
dos deuses e do mundo (chamados, respectivamente, mitos teogônicos e cosmogônicos),
dos homens, de determinados ritos religiosos, de preceitos morais, tabus,
pecados e redenção. Em certas religiões, os mitos formam um corpo doutrinal e
estão estreitamente relacionados com os rituais religiosos -- o que levou
alguns autores a considerar que a origem e a função dos mitos é explicar os
rituais religiosos. Mas tal hipótese não foi universalmente aceita, por não
esclarecer a formação dos rituais e porque existem mitos que não correspondem
a um ritual.
O mito, portanto, é uma linguagem apropriada para a religião. Isso não
significa que a religião, tampouco o mito, conte uma história falsa, mas que
ambos traduzem numa linguagem plástica (isto é, em descrições e narrações)
uma realidade que transcende o senso comum e a racionalidade humana e que,
portanto, não cabe em meros conceitos analíticos. Não importa, do ponto de
vista do estudo da mitologia e da religião, que Prometeu não tenha sido
realmente acorrentado a um rochedo com um abutre a comer-lhe as entranhas, nem
que Deus não tenha criado o ser humano a partir do barro. Religião e mito
diferem, não quanto à verdade ou falsidade daquilo que narram, mas quanto ao
tipo de mensagem que transmitem.
Como forma de comunicação humana, o mito está obviamente relacionado
com questões de linguagem e também da vida social do homem, uma vez que a
narração dos mitos é própria de uma comunidade e de uma tradição comum. Não
se conseguiu definir, no entanto, a natureza precisa dessas relações. Alguns
lingüistas admitem explicitamente a necessidade de uma ciência mais
abrangente, como por exemplo uma nova ciência geral da semiologia, cuja tarefa
seria estudar todos os signos essenciais à vida social, e uma nova psicologia,
que caracterizaria inicialmente vários sistemas do conhecimento e da crença
humanos. O estudo da sociedade e da linguagem pode começar apenas com os
elementos fornecidos pela fala e pelas relações sociais humanas, mas em cada
caso esse estudo se confronta com uma coerência de tradições que não está directamente
aberta à pesquisa. Essa é a área em que atua a mitologia.
Algumas
concepções mitológicas podem exemplificar a complexidade e a variedade das
relações entre mito e sociedade. A tribo lugbara (do noroeste de Uganda e do
Congo) utiliza um sistema conceptual para relacionar sua ordem sociopolítica a
dois heróis ancestrais, relacionados, em contrapartida, à criação do
universo. As narrações sobre a evolução da tribo a partir de seus heróis
ancestrais são apresentadas na forma de saga, embora a "história"
mais primitiva seja contada em mitos. É notável, porém, que o único esquema conceptual
do sistema social dos lugbara relacione o passado mítico e o genealógico (não-mítico)
e que, em seu conjunto, seja expresso mais em categorias espaciais do que histórico-temporais. Mito e psicologia Freud
deu nova orientação à interpretação dos mitos e às explicações sobre sua
origem e função. Mais que uma recordação ancestral de situações históricas
e culturais, ou uma elaboração fantasiosa sobre fatos reais, os mitos seriam,
segundo a nova perspectiva proposta, uma expressão simbólica dos sentimentos e
atitudes inconscientes de um povo, de forma perfeitamente análoga ao que são
os sonhos na vida do indivíduo. Não foi por outra razão que Freud recorreu ao
mito grego para dar nome ao complexo de Édipo: para ele, o mito do rei que mata
o pai e casa com a própria mãe simboliza e manifesta a atracção de carácter
sexual que o filho, na primeira infância, sente pela mãe e o desejo de
suplantar o pai. "Não
será verdade que cada ciência, no final das contas, se reduz a um certo tipo
de Mitologia?" Sigmund
Freud Para Carl Gustav Jung, discípulo de Freud e seu colaborador
por muitos anos, os mitos seriam uma das manifestações dos arquétipos ou
modelos que surgem do inconsciente colectivo da humanidade e que constituem a
base da psique humana. A existência do inconsciente colectivo permite
compreender a universalidade dos símbolos e dos mitos, pois que estes se
revelam em todas as culturas e em todas as épocas de modo idêntico. A Importância
dos Mitos para a Psicologia O papel dos
Mitos é extremamente importante na constituição da cultura, independente do
local que se originou – se pertence ou não a um povo – o mito contribuiu
para o desenvolvimento individual e colectivo. Os mitos permitem
a tomada de consciência sobre a vida instintiva, possuem a capacidade de
gerarem padrões de comportamento que garantem a evolução psico-sosial (como
também defende Mihaly Csikszentmihalyi), e a atitude criativa perante a vida
(nos diferenciando dos animais). Eles não deixam de representar a história da
nossa humanidade, dando um sentido à nossa existência
afectiva e espiritual. Como diz Joseph Campbell: “aquilo que os seres
humanos têm em comum revela-se nos mitos. Eles são histórias da nossa vida,
da nossa busca da verdade, da busca do sentido de estarmos vivos.
Os mitos são pistas para as potencialidades espirituais da vida humana,
daquilo capazes de conhecer e experimentar interiormente”. Segundo Italo
J. Furletti os mitos em suas acções estruturantes, possibilitam referências (
consciente ou inconscientemente), a um padrão mais adequado de comportamento,
como por Ainda
segundo o mesmo autor, no processo de análise psíquica, eles são extremamente
úteis como mecanismos de amplificação
de focos psicológicos; principalmente, quando esses focos estão carregados de
energia afectiva. Ou seja o ser humano possui uma enorme dificuldade em
perceber seus comportamentos, principalmente os não benéficos, mesmo as
pessoas auto-depressiativas e a maioria dos comportamentos, de certa forma não
apropriados, possuem um ganho secundário cujo benefício para o sujeito é da
ordem do inconsciente. Isto não deixa de se ir concentrando numa enorme carga
afectiva que tende cada vez mais a aglomerar energia psíquica. Assim pode
evoluir tanto, ao ponto de criar um complexo afectivo. Independentemente de
chegarem a esse ponto os mitos, por serem expressão de arquétipos (jung) –
padrões de comportamento da herança da humanidade, permitem à pessoa se rever
neles (consciente ou inconscientemente) e assim se pode remodelar as suas
posturas. A
acção do mito funciona tal qual um sonho, como defendia o próprio Freud,
“os mitos são uma expressão
simbólica dos sentimentos e atitudes inconscientes de um povo, de forma
perfeitamente análoga ao que são os sonhos na vida do indivíduo”, os mitos
estão para a sociedade, assim como os sonhos estão para o indivíduo. Ambos
através das suas mensagens promovem a saúde, independentemente ou não de se
entender o seu significado simbólico, eles possuem uma eficácia por si mesmo.
Se for possível compreender o desempenho do arquétipo no mito, ou, entender a
acção arquetípica no sonho, isso permitirá uma maior liberdade decorrente do
mundo instintivo, com também, uma maior liberdade de acção, um desprendimento
da inserção e imposição sociocultural. O
mito devido à sua riqueza simbólica quando corresponde a um comportamento,
serve para ampliar o conteúdo afectivo. Quando não facilita a percepção do
que era inconsciente, pelo menos, envolve o sujeito em outros parâmetros de
comportamento, possibilitando uma reformulação das acções numa perspectiva
de uma postura mais saudável de viver, ou apenas, amenizando o sofrimento. Bibliografia: ·
Rivière, C. Introdução à Antropologia, Edições70,
Lisboa (2000). ·
Eliade, M. Aspectos
do Mito, Edições70, Lisboa ·
Csiksentmialyi,
M. Novas Atitudes Mentais, Circulo de Leitores (1998) 8
www.geocities.com/viena/2809/mitos.html 8
http://sites.uol.com.br/mdimpo/
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2001 Psicoforum - Vítor Fragoso
A
Nessecidade do Mito
É comum encontrar nas várias mitologias a figura de um criador, um
demiurgo que, por ato próprio e autónomo, estabeleceu ou fundou o mundo em sua
forma atual. Os mitos desse tipo costumam mencionar uma matéria preexistente a
toda a criação: “o oceano, o caos (segundo Hesíodo) ou a terra (nas
mitologias africanas). A criação ex nihilo (a partir do nada, sem matéria
preexistente) já reflecte algum tipo de elaboração filosófica ou racional. A
cosmogonia chinesa, por exemplo, atribui a origem de todas as coisas a Pan Gu,
que produziu as duas forças ou princípios universais do yin e yang, cujas
combinações formam os quatro emblemas e os oito trigramas e, por fim, todos os
elementos”.
Mitos
escatológicos
Morte. Para a mitologia, a morte não aparece como fato natural, mas como
elemento estranho à criação original, algo que necessita de uma justificação,
de uma solução em outro plano de realidade. Três explicações predominam nas
diversas mitologias. Há mitos que falam de um tempo primordial em que a morte não
existia e contam como ela sobreveio por efeito de um erro, de castigo ou para
evitar a superpopulação. Outros mitos, geralmente presentes em tradições
culturais mais elaboradas, fazem referência à condição original do homem
como ser imortal e habitante de um paraíso terreno, e apresentam a perda dessa
condição e a expulsão do paraíso como tragédia especificamente humana. Por
fim, há o modelo mítico que vincula a morte à sexualidade e ao nascimento,
analogamente às etapas do ciclo de vida vegetal, e que talvez tenha surgido em
povos agrícolas.
Os mitos da destruição escatológica manifestaram-se tardiamente, na
literatura apocalíptica judaica, que floresceu entre os séculos II a.C. e II
d.C., e deixou sua marca no livro do Apocalipse, atribuído ao apóstolo João.
Exemplo típico de mito de destruição (embora não no fim dos tempos) são as
narrativas a respeito de grandes inundações. É bastante conhecido o episódio
do Antigo Testamento que descreve um dilúvio e o
.
Nas escrituras hinduístas e
budistas, elaborou-se um complexo sistema de mundos que desaparecem e ressurgem,
sempre num total de quatro. Essa concepção cíclica determinou a adaptação
de relatos védicos anteriores e o desenvolvimento de uma doutrina que explica a
formação e absorção periódicas do universo como fases de actividade e
repouso de energia. Os ascetas e os maias acreditavam que o mundo actual. havia
sido precedido de outros quatro, o último dos quais teria sido destruído por
um cataclismo; ambos os povos desenvolveram um complicado calendário, a cujo
estudo se dedicavam vários sacerdotes astrónomos.
A concepção linear e progressiva de tempo (oposta à repetição cíclica)
é característica das chamadas religiões históricas --
judaísmo, cristianismo, islamismo --, que afirmam a intervenção de Deus na
história, num acontecimento único e irrepetível, e a existência de uma meta
final de salvação da humanidade.
As mudanças e transformações que se dão nos momentos críticos da
vida individual e social são objecto de particular interesse mitológico e
ritual: nascimento, ingresso na vida adulta, casamento, morte - acontecimentos
marcantes para a pessoa e sua comunidade -são interpretados como actualizações
de processos cósmicos ou de realidades míticas.
A mensagem religiosa geralmente exige determinado comportamento perante
Deus, o sagrado e os homens, e é, muitas vezes, formulada de forma compatível
com conceitos racionais e em doutrinas sistematizadas. O mito abrange maior
amplitude de mensagens, desde atitudes antropológicas muito imprecisas, até
conteúdos religiosos, pré-científicos, tribais, folclóricos ou simplesmente
anedóticos, que são aceitos e formulados de modo menos consciente e
deliberado, mais espontâneo, sem considerações críticas.
Como
a Psicologia vê o Mito?
Carl
Gustav Jung - A Psicologia Analítica e a Justificação do Mito – “Desenvolver
a fantasia significa aperfeiçoar a Humanidade”-
Jung